Mulheres parlamentares de todo o mundo citaram a divisão desigual do trabalho de cuidados como um dos principais obstáculos para a igualdade entre homens e mulheres no campo do trabalho. O assunto foi discutido na 3ª sessão de trabalho da 1ª Reunião de Mulheres Parlamentares do P20, o fórum do Legislativo do G20, nesta terça-feira (2) em Maceió (AL). O tema da sessão foi “Promoção da igualdade, autonomia econômica das mulheres e superação do racismo”.
Coordenadora do Observatório Nacional da Mulher na Política da Câmara dos Deputados, a deputada Yandra Moura (União-SE) disse que a desigualdade econômica entre homens e mulheres é uma das mais visíveis e persistentes formas de desigualdade de gênero. “Este cenário afeta desde o enfrentamento da violência doméstica, já que a falta de autonomia econômica das mulheres dificulta o rompimento do ciclo de violência, até o desenvolvimento econômico sustentável das nações, já que há um alarmante subaproveitamento de metade das nossas forças de trabalho”, afirmou.
Segundo a parlamentar, essa desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho é tendência global. “Uma das suas principais causas reside da divisão desigual do trabalho não remunerado de cuidados, algo que vemos em maior ou menor grau em todo o mundo”, salientou. Ela destacou que as mulheres dedicam duas vezes mais tempo aos afazeres domésticos do que os homens.
Yandra Moura alertou que, embora metade dos lares brasileiros sejam chefiados por mulheres, elas recebem em média salários 20% menores que os homens no Brasil. “Quando comparamos os ganhos salariais entre mulheres negras e homens brancos, a diferença chega a quase 50%”, completou.
O Brasil aprovou no ano passado uma lei específica para combater a desigualdade salarial, ampliando a transparência salarial nas empresas e reforçando penalidades para empregadores que pagam salários desiguais para homens e mulheres nas mesmas funções.
Mas, na visão da deputada, é preciso ir além, garantindo às mulheres chances reais de ocupar as mesmas funções que os homens. “Por essa razão é que nós, parlamentares brasileiras, colocamos como prioridade do nosso trabalho na Câmara a construção de um arcabouço legislativo sobre políticas do cuidado, com dois grupos de trabalho formados por parlamentares de vários partidos políticos voltado para esse desafio”, informou.
“Neles, trabalhamos pela regulamentação de licenças mais igualitárias, pela ampliação dos serviços públicos e gratuitos de cuidados e pela conscientização da população para as mudanças culturais que precisam ser enfrentadas para combater a desigualdade de gênero”, disse Yandra Moura.
Sistema de cuidados público
De acordo com a representante da ONU Mulheres Cecilia Alemany, a mudança na economia do cuidado pode corrigir as desigualdades no mercado de trabalho e também aumentar a participação das mulheres na política. Ela defende um sistema de cuidados público abrangente para todos os estágio da vida, o que também aumentaria a proteção social.
“Aqui a gente fala não só do estabelecimento de uma infraestrutura do cuidado, mas também de ter o cuidado como um trabalho reconhecido, tendo o cuidado como um trabalho decente daquelas mulheres que estão dedicadas a essas atividades”, frisou Carolina Querino, também representante da ONU Mulheres. “E aqui eu gostaria de recuperar os direitos das trabalhadoras domésticas, que são muitas vezes invisibilizados”, acrescentou.
Qualificação das mulheres
A senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO) defendeu as políticas de igualdade salarial e também o investimento na educação e na qualificação de mulheres, além do combate à violência física e psicológica no trabalho.
“No Brasil, o Parlamento tem colocado como meta principal construir a legislação para que exista o fortalecimento das oportunidades de qualificação, de formação, políticas de financiamento, inclusive junto aos bancos públicos e privados. Esse é o debate que o Parlamento brasileiro tem levado e avançado”, apontou.
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Presidente da Câmara de Deputados do México, Marcela Guerra Castillo também defendeu a formulação de leis para combater a violência no trabalho contra as mulheres, políticas para igualdade salarial e para eliminar a descriminação, além de programas de capacitação para o trabalho e de educação financeira voltados para elas.
A deputada mexicana ressaltou a importância do acesso ao crédito para as pequenas e médias empreendedoras. E defendeu ainda horário flexível de horários de trabalho para as mulheres que estão criando seus filhos.
Presidente do Parlamento do Mercosul (Parlasul), a parlamentar argentina Fabiana Martín defendeu que os países formulem leis que garantam a formação de mulheres livres e independentes e a cooperação dos diferentes agentes para garantir o empoderamento de meninas e jovens.
Diferenças na Europa
Representante da Alemanha, Susanne Hierl ressaltou que, em seu país, 76,6% das mulheres de 20 a 64 anos de idade têm trabalho remunerado, em contraposição a 84% dos homens. Para atingir esses índices elevados, a Alemanha investiu, por exemplo, em programa para melhorar as oportunidades de mulheres nas ciências, pesquisas e inovação. Ela chamou a atenção para a importância de se combater estereótipos de gênero para promover a igualdade de gênero no trabalho.
Segundo Annarita Patriarca, representante da Itália, 53% das mulheres na Itália até 64 anos estão no mercado de trabalho, em comparação a mais de 74% dos homens. Ela afirmou que a Itália tem um dos piores índices da União Europeia de desigualdade de gênero no mercado de trabalho. Como um dos principais fatores para isso, a parlamentar citou o fato de o trabalho doméstico ainda recair sobre a mulher no país e defendeu a oferta ampla de creches e licenças para a criação de filhos compartilhadas entre pais e mães, além de horários flexíveis de trabalho.
De acordo com a parlamentar italiana, desde o ano passado, o código de empresas a favor da maternidade visa criar ambiente de colaboração entre empregadores e empregados para que a maternidade possa se conciliar com o trabalho.
Cotas em empresas
Parlamentar da Noruega, Linda Monsen Merkesdal atribuiu a riqueza do país, em parte, à educação e à participação das mulheres na força de trabalho, incrementando o PIB norueguês. Considerada pelo Fórum Econômico Mundial como economia mais inclusiva do mundo, a Noruega foi o primeiro país a implementar cotas de participação das mulheres em empresas públicas limitadas.
A deputada de Portugal Emília Cerqueira informou que, no país, estima-se que as mulheres tenham 48 dias a mais de trabalho não remunerado por ano e que a diferença salarial entre homens e mulheres gire em torno de 13%. “No entanto, quando chegamos aos topos das carreiras, as mais bem remuneradas, essa não é a realidade, e a diferença salarial pode chegar a 26% entre homens e mulheres”, observou.
A parlamentar portuguesa citou duas medidas que considera importante para garantir a igualdade no trabalho: o direito ao se desligar – isso é, o direito do empregado não ser contactado pelo empregador após o seu horário – e o direito ao teletrabalho para as mulheres que cuidam de crianças ou familiares com problemas de saúde e para as vítimas de violência doméstica.
Mulheres agricultoras
Representante da Coreia do Sul, Lim Miae pediu atenção para as mulheres agricultoras, as primeiras a sentir os impactos das mudanças climáticas. De acordo com a parlamentar, o governo sul-coreano implementou programa para garantir às agricultoras renda mínima, mas poucas aderiram por falta de divulgação. Ela defendeu políticas para as mulheres serem gestoras das próprias terras e a diminuição de idade para a aposentadoria delas, além de medidas para assegurar a saúde das agriculturas.
Representante da Índia, a senadora Kalpana Saini afirmou que a igualdade de gênero está na Constituição do país e que, nos últimos anos, foram dados alguns passos para garanti-la, como medidas para encorajar a participação das mulheres nos serviços do governo e a aprovação de lei garantindo licença especial para mulheres com filhos com deficiência, além de programas de assistência para mulheres agricultoras.
Representante da Arábia Saudita, Alia muhammad Al-dahlawi disse que o governo de seu país tem feito esforços para alcançar a igualdade entre homens e mulheres em diversos campos e promove campanhas para conscientizar as mulheres sobre a importância da autonomia econômica. Conforme ela, oportunidades de trabalho no país se abrem nos campos do turismo, entretenimento e tecnologia, e foi feita revisão na legislação para proibir discriminação e promover programas de renda para as mulheres.
A parlamentar Paula Moeda, representante de Cabo Verde, afirmou que a taxa de desemprego das mulheres no país é mais elevada do que a dos homens, estando mais presente nas categorias com remuneração mais baixa. Ela também considera as tarefas de cuidado como o principal obstáculo para a igualdade no trabalho.