A Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados reuniu, nesta quinta-feira (6), ilustradores e cartunistas em defesa da oficialização do Dia do Quadrinho Nacional, que será alvo de futuro projeto de lei. Também pediram a aprovação da proposta (PL 6060/09) de estímulo fiscal às editoras que publicam quadrinhos brasileiros.
Rick Goodwin, que foi editor de entrevistas do clássico semanário O Pasquim e hoje é colaborador do Instituto Ziraldo, definiu as bases dessa arte secular, popular e com público cativo.
“Compõe-se basicamente de uma série de quadrinhos que, colocados em sequência, contam uma história. É um estímulo enorme à imaginação dos leitores. Os quadrinhos são essencialmente interativos”, disse.
Apesar de contar com várias escolas e temáticas, essa arte costuma enfrentar preconceito e menosprezo, que a associam a temas meramente infantis ou a apêndice do gênero literário. O mundo costuma celebrar o Dia do Quadrinho, em 5 de maio, inspirado no personagem norte-americano Yellow Kid, criado em 1895. Porém, pesquisadores brasileiros encontraram uma publicação bem mais antiga: “As aventuras de Nhô Quim”, uma série de quadrinhos de Ângelo Agostini, que saiu inicialmente na revista Vida Fluminense, do Rio de Janeiro, em 30 de janeiro de 1869. Essa data já é considerada informalmente Dia do Quadrinho Nacional desde os anos 80, com o apoio de cartunistas como Ziraldo, Henfil e Fortuna, entre vários outros.
Nos próximos dias, a deputada Juliana Cardoso (PT-SP), que costuma usar quadrinhos na comunicação com seus eleitores, vai apresentar projeto de lei para oficializar a data.
“Não é só um simples dia, mas uma forma de também conseguir pensar política pública, com orçamento para que ela possa chegar na ponta”, ressaltou.
Atualmente, a legislação (Lei 12.345/10) exige prévio debate público com amplos setores da população antes da proposta de criação de dias comemorativos. Durante audiência na Comissão de Cultura, a cartunista Laerte, com mais de 50 anos de atividade profissional, lembrou que a arte do quadrinho teve papel fundamental na luta contra a ditadura militar e na redemocratização do país.
“Tanto é que, quando se deu o fim da ditadura e da censura, a linguagem de quadrinho que prevaleceu e se se espalhou foi a linguagem da sátira, da caricatura, da intervenção política”, afirmou Laerte.
Mercado diverso
A presidente do Instituto Memorial das Artes Gráficas do Brasil (Imag), Daniela Baptista, tenta criar um Museu do Quadrinho desde a virada do século, mas lamenta a falta de apoio e a baixa preservação do acervo nacional. Daniela cobra incentivos para manter a expansão da arte.
“Estão super profícuos o mercado e a produção das mulheres atualmente, saindo do eixo Rio – São Paulo, o que é maravilhoso: Norte, Nordeste, a produção indígena com as temáticas indígenas, as temáticas do meio ambiente. Todas as pautas estão sendo contempladas”, disse.
Daniel Esteves Pereira, do movimento “Quadrinistas Uni-Vos”, concordou.
“Os quadrinhos talvez sejam o vetor principal, por exemplo, de questões sobre feminismo, antirracismo, LGBTQIA+: vozes diferentes produzindo cultura, o que é muito importante”.
Um exemplo é Geuvar de Oliveira, integrante do Coletivo de Quadrinistas e Ilustruadores Os Cabrones, que dá vazão à cultura afro-brasileira no Tocantins.
“A gente quase não vê quadrinhos de pessoas negras. Tem pouca gente, mas não é por falta de capacidade; talvez por falta de oportunidade”, apontou.
Cinema e escola
Os quadrinistas citaram a relevância da arte para o cinema dos Estados Unidos, lembrando que muitos super-heróis de Hollywood nasceram nos quadrinhos.
O presidente da Associação dos Cartunistas do Brasil, José Alberto Lovetro, mais conhecido como Jal, também citou a relevância da arte para a educação. Lembrou que a ONU já homenageou Maurício de Souza, criador da Turma da Mônica, pelo estímulo à leitura e à alfabetização. Também falou de pesquisa da Universidade de Brasília (UnB) que mostrou o papel dos quadrinhos no aprendizado escolar.
Jal ainda contou a experiência própria com crianças e adolescentes da Fundação Casa, a antiga FEBEM de São Paulo.
“Eles começaram a desenhar a história deles em quadrinhos. Isso se transformou em uma terapia antiviolência”.
Diversos ilustradores elogiaram a inclusão dos quadrinhos no Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNDE), mas também cobraram maior interlocução com o governo federal.