A Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei complementar que cria conta-corrente específica para repasses federais e de emendas parlamentares direcionados a prestadores privados de serviços no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). A matéria será enviada ao Senado.
De autoria do deputado Antonio Brito (PSD-BA), o Projeto de Lei Complementar 57/22 altera a lei sobre aplicações mínimas em saúde pública (Lei Complementar 141/12).
Com a mudança, prestadores privados desses serviços, inclusive, mas não só, aquelas sem fins lucrativos, como as Santas Casas, poderão receber diretamente os recursos de transferências regulares, automáticas e obrigatórias (“emendas Pix”) sem a necessidade de passarem antes pela prefeitura ou governo estadual da localidade.
O texto aprovado contou com emenda do relator na Comissão de Finanças e Tributação (CFT), deputado Luiz Gastão (PSD-CE), que exclui os hospitais universitários federais do mecanismo.
Segundo ele, a atual lei de diretrizes orçamentárias (LDO 2024) prevê o repasse de recursos diretamente às unidades orçamentárias desses hospitais; e uma portaria de 2017, do Ministério da Saúde, determina que o dinheiro enviado diretamente aos hospitais universitários federais não deve passar pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS).
Luiz Gastão afirmou que a proposta deve melhorar a transparência e eficiência ao criar contas específicas para receber transferências automáticas regulares obrigatórias destinadas ao custeio da cobertura de ações e serviços de saúde para prestadores de serviços privados, incluindo as Santas Casas.
“Nenhum outra grupo de entidades assistenciais pode ser considerado tão importante para descentralização das ações e dos serviços públicos de saúde, que são dever do Estado brasileiro”, destacou.
Luiz Gastão observou que quase 3 mil estabelecimento de saúde filantrópicos que prestam serviço ao Sistema Único de Saúde, sendo responsáveis por quase 42% das internações de média e alta complexidade. “Em 911 municípios, a assistência hospitalar é realizada unicamente por essas unidades.”
Gargalo
O deputado Hildo Rocha (MDB-MA) afirmou que a proposta resolve o gargalo de repasse de recursos para entidades filantrópicas. “A conta específica acelera e facilita a execução desses recursos. Algumas administrações dificultam a transferência desses recursos, o que atrapalha o funcionamento dessas entidades e a população que recebe esse serviço é prejudicada”, lamentou.
O deputado Charles Fernandes (PSD-BA) também espera que a conta específica facilite a administração de recursos para Santas Casas. “Quantas vezes a gente vê a Santa Casa passar por dificuldades financeiras até porque o prefeito não repassa o dinheiro”, comentou.
O deputado Benes Leocádio (União-RN) sugeriu que os gestores fossem punidos quando não transferissem recursos a hospitais e Santas Casas. “Não podemos aceitar a arrogância de determinados gestores”, declarou.
Autonomia
Alguns deputados acusaram a proposta de prejudicar a autonomia das prefeituras e estados de administrar os recursos de saúde. O deputado Jorge Solla (PT-BA) defendeu que o projeto limitasse a transferência para conta específica apenas a recursos de emendas parlamentares.
“O texto terminou envolvendo todo e qualquer recurso repassado no Fundo Nacional de Saúde para estados e municípios. Isso quebra completamente a autonomia dos gestores municipais e dos gestores estaduais”, ponderou. “Não tem cabimento o governo federal dizer quanto é que vai repassar para Santa Casa de Porto Alegre. A contratualização é feita no território onde a gestão acontece e há muitos anos o Ministério da Saúde não tem mais contrato direto com hospital.”
O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) alertou para o risco de inibir o gestor estadual e municipal de dirigir recursos para entes privados. “Esses entes ganham com esse projeto um espaço privilegiado contra os próprios recursos separados em conta corrente. Sabemos que a política da barganha predomina no Brasil e pode ficar reforçada”, afirmou. “A Secretaria de Planejamento e Orçamento é contra o texto como está e recomenda consultas ao Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e ao Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems)”, completou.
Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), a norma é abrangente demais. “O que nós estamos questionando aqui é haver uma conta própria do Fundo Nacional de Saúde, até porque não está só a filantropia, está a filantropia e o setor privado todo, tirando completamente a autonomia do gestor”, afirmou.